Como sentir o tempo?
Como sentir o tempo, ao invés de medi-lo?
Já percorremos um caminho no post anterior – Para pensar o tempo, refletindo um pouco sobre as métricas numéricas com as quais sempre estamos às voltas para nos relacionar com o tempo. E parece que por achar que controlamos o tempo, também achamos que controlamos os processos. E assim, criamos um método para “resolver as coisas”, como aponta Carl Honoré:
“Está sem tempo para ler o romance que ganhou no Natal? Aprenda leitura dinâmica. A dieta não funciona? Vá para a lipoaspiração. Sem tempo para cozinhar? Compre um micro-ondas. Mas acontece que certas coisas não podem nem devem ser apressadas. Elas levam tempo, precisam de lentidão. Quando aceleramos coisas que não devem ser aceleradas, quando esquecemos como é possível moderar o ritmo, sempre pagamos um preço.”
Acredito que esse método de acelerar tudo, nos tira justamente as métricas subjetivas, que são aquelas sensações e, por que não, aprendizados no corpo que levam tempo. Não há como ler um livro muito rápido e de fato experimentar a leitura. Os processos emocionais e de aprendizados exigem tempo e você precisa explorar, investigar. Quando eu te pergunto “como você sente o tempo?” Essa pergunta é um enigma, e como qualquer enigma exige esforço, trabalho e não será com uma olhada no relógio que você conseguirá respondê-la.
O tempo da leitura é assim, é como se fosse um enigma. Você se senta de forma confortável, abre um livro e inicia a leitura, sem saber aonde ela te levará e tampouco em que estado você estará ao fim dessa leitura. Isso leva tempo, tempo para reconhecer as palavras, para associá-las, para trazer à memória e ao corpo algum cheiro, alguma sensação, algum desvio na história que lhe cause mal-estar ou euforia. Nada está garantido nos 10 minutos de leitura que seu relógio vai cronometrar. Carlo Rovelli aponta que:
“A diferença entre coisas e eventos é que as coisas permanecem no tempo. Os eventos têm duração limitada. Um protótipo de “uma coisa” é uma pedra: podemos perguntar onde ela estará amanhã. Um beijo, por sua vez, é um “evento”. Não faz sentido perguntar para onde terá ido o beijo amanhã. O mundo é feito de redes de beijos, não de pedras.”
Podemos fazer uma analogia com o livro e a leitura. Posso lhe perguntar “onde está aquele livro que você leu no ano passado?” e você conseguirá localizá-lo na sua casa, lembrará que está emprestado ou até mesmo perdido. Mas, se eu te perguntar onde está a leitura que você fez dele? Dificilmente você pode localizá-la em algum lugar físico. O que lhe resta é me narrar a experiência e se foi feita às pressas, talvez não lhe reste nada a contar. A experiência de leitura é como o mundo, é feita de redes de beijos, eventos que você se permitiu sentir e experimentar. A experiência de leitura não é sobre a quantidade de livros, definitivamente, no fim se trata do tempo que você se permitiu ter com eles.
Carla Paiva
Outros livros…
Outros caminhos…
Comecei a acompanhar o trabalho do Torus Lab do Tempo já faz algum tempo e tem me provocado muitas questões interessantes em como sentir o tempo.